
A hipocrisia generalizada nunca acabará com a violência nos estádios_
Por Guilherme Santos
A rotina é quase sempre a mesma: basta acontecer uma briga dentro ou no entorno de estádios para que clubes, torcedores e até parte da imprensa encarem o acontecimento como um fato isolado. Criticam-se os brigões e recomeçam as batidas campanhas que pedem paz nos estádios. E quando poder público e clubes começarão a combater a causa e não apenas as consequências deste problema social?
Uma das defesas utilizadas pelos cartolas dos times é a identificação dos infratores, como no caso emblemático da torcedora do Grêmio que proferiu ofensas racistas ao goleiro Aranha, do Santos. Mesmo assim, os resultados são punições irrisórias, isso quando existem. No caso da torcedora, foi ser obrigada a comparecer por um ano à delegacia em dias de jogos do time.Há ainda a cultura de individualização do fato. Mesmo quando dezenas de torcedores de Vasco e Atlético Paranaense se deslocaram até Joinville, em Santa Catarina, para transformarem a arquibancada da Arena JEC em uma verdadeira batalha campal, sem qualquer motivo aparente, o problema foi tratado com pessoalidade.
Não. A violência física e verbal, o racismo, o machismo e a homofobia não são problemas causados por um ou outro torcedor. O que se vive atualmente nos estádios de futebol é uma epidemia de violência iniciada há décadas, que cresce justamente pela relativização dos fatos.O que mais poderia explicar, por exemplo, que o “caso Aranha” tenha tido tanta repercussão quando outros episódios de racismo, tão recorrentes no futebol, não ganham qualquer notoriedade na mídia. A indignação é seletiva e midiática.
A cena do Daniel Alves, lateral do Barcelona, que comeu uma banana lançada em sua direção durante um jogo na Europa, mobilizou uma campanha mundial. Patrocinada, importante frisar. Com o nome “somos todos macacos”, ela rendeu mais alguns milhões para uma grife do empresário e apresentador de TV Luciano Huck. O racismo, porém, não diminuiu.Se poder público e órgãos privados ligados ao futebol não pressionarem por medidas legais e fiscalização mais rígidas, as “cenas lamentáveis” continuarão a se repetir. A hipocrisia em relação às causas também precisa ser deixada de lado caso realmente haja uma vontade de mudança de fato.
Por que é preciso esperar até que atitudes extremas aconteçam, como a morte de torcedores, para que qualquer ação seja tomada? Não seria mais fácil combater as raízes do problema, como a cultura da violência nos estádios, que conta com a conivência dos demais presentes?